quinta-feira, 2 de outubro de 2008

Razão é...


Erastótenes (275-195)

Continuamos com a desconstrução, procurando distinguir no Humano o que é hardware do que é software. O professor afirma não saber o que é a razão. Fico a cogitar. Não lhe chega a razão de Voltaire, de Descartes, de Kant. Entendo o que diz. Essa razão tão apregoada peles luzes desemboca 100 anos mais tarde na supremacia branca (mas apenas a da Europa do norte, já que a África tinha início para lá dos Pirenéus... privilégio de ser Africano, não esquencendo que a Lucy nasceu em África), e concretiza-se plenamente no século XX, com Auchvitz. Essa razão, certamente não interessa. Ocorre-me uma definição possível para Razão : acto de coragem, de quem, sabendo das sua limitações, tem a a força suficiente para afastar a superstição, o mito, as convicções religiosas, os sentimentos e os preconceitos, e com simples observações e usando o raciocínio chega a conclusões correctas. Razão foi aquilo que Erastótenes teve, 200 anos antes de Cristo, ao afirmar que a terra era uma bola, e ao indicar o seu diâmetro com 1% de erro! Absolutamente notável, um hino à Razão, à inteligência. Erastótenes viveu no Egipto Ptolomaico, e tinha verificado que, no dia mais longo do ano, no solstício do Verão, ao meio dia, se podia observar o sol no fundo de um poço em Siena, perfeitamente no zénite, ou seja, na vertical. Não havia qualquer sombra dentro do poço. Ora acontece que, sendo um homem perspicaz, Erastótenes se lembrou que, no mesmo dia do ano, à mesma hora, mas 800 Km mais a norte, em Alexandria, as colunas de um templo exibiam uma sombra, que fazia um ângulo de 7 graus com as colunas. O raciocínio era que, se a terra fosse plana, e estando o Sol para efeitos práticos no infinito, então faria sentido não haver sombras nas colunas do templo, e ver o Sol no fundo do poço em Siena. Mas não era isso que se observava. Erastótenes deduziu que as suas observações fariam sentido se se toma-se a terra como uma esfera. Aplicou então uma regra de 3 simples: se para 800 Quilómetros que separavam Siena de Alexandria o ângulo era de 7 graus, para 360 graus - O circulo completo, ou o diâmetro da terra, a distância seria X. E assim, apenas com sombras, poços e raciocínio achou o valor correcto. Foi um homem capaz de um acto de coragem. Tão mais fácil seria dizer que o mundo era o que era por vontade dos Deuses. Mas deixou-os de lado, e o mundo ficou diferente, pelo menos até que a superstição voltasse a falar mais alto, que a biblioteca de Alexandria se torna-se uma pira infame (como todas as piras onde se queimam livros). Poucos séculos antes antes, Platão afirmava que a Lua tinha fases porque estava na sua natureza ter fases! Uma bela frase que não passava de um jogo de palavras. Humildemente prefiro a razão de Erastótenes. Não tivessem o Deus único imposto a sua lei, e talvez hoje estivesse-mos já a singrar por entre as estrelas. Relembro o saudoso Carl Sagan.
Mas o céu pode esperar.

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