terça-feira, 21 de outubro de 2008

Delírio

Bom, as aulas continuam, e o delírio também. Creio que me vou ficar pela bibliografia recomendada, até porque se torna incomportável a conciliação do emprego com as aulas. É difícil construir uma linha orientadora de raciocínio. Estamos no pós-científico. Muito bem, sim senhor. E depois? Parece que anda-mos em círculos, e por isso mesmo sem sair do mesmo sítio. Tudo é delírio e sexo - Meu Deus, como o sr. professor gosta de falar de sexo! No meu caso, e no que respeita à matéria, prefiro fazer a falar.... As representações são todas simbólicas, e Freud é uma espécie de totem! Afirmação complicada, depois de alguns semestres em que os colegas do distinto professor foram declarando Freud "persona non grata" para a Antropologia. Já tive a oportunidade de lhe explicar que nós alunos mais parecemos casquinhas de nozes em mar alteroso. Tenho para mim que o melhor é mesmo tentar perceber o que é que cada ilustre professor pretende ensinar, e tentar talvez papaguear as ideias fundamentais da cadeira no exame. Se tem que ficar assim, assim seja. Mas eu não "engulo" essa com facilidade. Não discuto que o professor tenha lido muitos e bons livros. Certamente que leu. Mas bons livros é o que não falta, felizmente. Posso até ter que ler os autores recomendados para a cadeira, mas esses autores não invalidam outros autores que eu já li, que foram estruturantes na minha construção enquanto indivíduo, e que eu não tenho a mais pequena intenção de abandonar, pelo menos até que apareça alguém que os possa refutar de forma segura e inequívoca. Cito Hubert Reeves e o seu "Um pouco mais de Azul"na aula. O professor responde que o exemplo é um belo exercício de poesia, mas que a ciência nada tem a ver com o assunto, e que mal iríamos nós com uma biblioteca feita com livros da GRADIVA! Depois desta afirmação, não me parece que haja muito mais a dizer. Não sei se o ilustre professor sabe, mas a GRADIVA foi a primeira editora a fazer um esforço real e reconhecido de divulgação científica em Portugal. Pode o ilustre professor depreciar este trabalho. Eu nunca o farei. Reconheço humildemente que tenho muitos autores de Antropologia para ler. Vou procurar fazêlo. Tenham os distintos Antropólogos a humildade de "pôr o nariz" noutros livros, ditos das ciências exactas, e aprender que existem nos seres Humanos raciocínios lógicos, muito para além do delírio, do sexo, do complexo de Édipo (ou de Electra), da vontade de matar o paizinho, do sado-masoquismo e afins. Tenho para mim (mas se calhar é mesmo coisa só minha), que não foi com delírios que se construíram pontes, aviões, computadores, sondas espaciais, tomografias, TEPS e outros "brinquedos" que nos tornam a vida mais fácil, e - basta um pouco de vontade, nos libertam em grande medida de uma existência miserável que foi o apanágio da Humanidade durante quase toda a sua existência.

Gosto muito dos novos autores que o curso me "obriga" a ler, mas gosto igualmente da "Poesia sóbria" de autores como Carl Sagan, Hubert Reeves, Richard Feynman, e tantos outros que nos conseguem transportar para um universo que contem o caos mas também a ordem, que permite construir,mais do que destruir. Pudesse eu recomendar alguns pequenos livros de construção do Homem, simples, mas por isso mesmo acessíveis e didácticos. Aconselharia talvez o incontornável "Cosmos" do Carl Sagan. Aconselharia igualmente o "Um mundo Infestado de Demónios," ou o "Um ponto azul claro" do mesmo autor. Aconselharia ainda o livro "A hora do deslumbramento", do Reeves, e tantos outros. E mesmo que não seja a ciência pura e dura, mais profunda, daquela que se faz em universidades e laboratórios, talvez fizessem pela Humanidade tão bem quanto os outros. E tenho para mim também que a fronteira entre as ciências ditas "exactas" e as "ciências Humanas" é apenas uma construção (quem sabe Simbólica?), destituída de qualquer sentido. E não arredo pé da ideia de que o Humano é construído sobre o Físico, (como tudo o resto) e que por isso mesmo tentar compreender o Humano sem compreender o Físico não é ciência, pelo menos tal como eu a entendo. Esse seria para mim o maior dos delírios.

É um curso deveras interessante, mas, do meu ponto de vista, tem demasiada cultura e muito pouco de biologia. Denoto o "saco de gatos" entre professores de Antropologia cultural e Antropologia Biológica. Eu só pretendia fazer parte do "saco" da Antropologia. Mas se tiver que escolher, então a escolha já está feita. Para quem quiser comparar a construção do curso, basta comparar com o curso de Coimbra.


Escrevi, está escrito.
Disse. Está dito.

Sem comentários:

Enviar um comentário