sexta-feira, 10 de outubro de 2008

Alentejo de Minh´Alma


Dia de viagem ao Alentejo, e mesmo que a trabalho, o eterno encanto da planície!
Não nasci no Alentejo. Nasci mais a norte, numa madrugada de Abril de 68, no Bombarral. Terra fértil, igualmente belíssima, de pomares e vinhedos.
Tardiamente conheci as terras que se estendem para além Tejo. Então porquê esta ligação, quase visceral, a uma terra que se estende suave, de vistas amplas? Porquê este fascínio, por esta paisagem que se estende até perder de vista? Aprecio a paisagem ao longo da Auto-estrada. As primeiras chuvas de outono já quebraram a crosta ressequida, e por isso as árvores não denotam o stress da falta de água. Ainda não há verde, esse virá daqui a uns dias. Tudo convida à contemplação, nesta terra aplanada por um oceano primevo. Até as pedras são gentis nesta terra, arredondadas por esse movimento longínquo das águas. Não há barreiras à vista, a orografia nada tem de agreste. As pessoas, sejam elas "nativas" que se denunciam pela pronúncia, seja "emprestadas" à terra, reflectem a paisagem. Na calma, no fluir do diálogo coerente com o fluir do tempo.
O local onde vou é aprazível. Meia dúzia de casas no meio de um monte, perdido na vastidão da planície. Aquelas crianças que ali são acolhidas não sabem, mas eu adoro-as. Gente a quem a biologia pregou uma partida. Tropeções no número de cromossomas, "conversas" mal resolvidas entre genes e meio, numa altura em que o "diálogo" deveria ser inteiramente perceptível, para que a "sinfonia" pudesse vir a enquadrar-se melhor nos padrões chamados normais... Filhos de um Deus menor, dirão outros. Mas eu não creio nisso. Os sorrisos são afáveis e sinceros. Alguns conversam comigo, mostrando aquilo que são: pessoas normais, com um diálogo coerente. Como sempre procuro os olhos, neles reconheço a chama da inteligência. Reencontro alguém que já mais do que um cliente. É antes de mais um amigo. Apresenta-me uma jovem dinâmica e enérgica que apreende com facilidade o que é proposto aprender: gerir o sistema informático. Surpreende-me a sua juventude, simpatia, dinamismo e forma fácil de aprender. Indago sobre a sua formação académica. A resposta surpreende - Psicóloga, e professora numa universidade! A retracção é imediata, quase instintiva. Ainda não sei porquê esta reacção sempre que nos deparamos com psicólogos, como se existisse o receio de que a sua formação permitisse automaticamente descobrir algo do nosso inconsciente! Trocamos algumas impressões sobre psicologia, sobre abordagem de determinados assuntos por "totens" da psicologia e "totens" da Antropologia. Relembro a alegoria dos cegos que tocam o elefante, cada um deles numa parte diferente, e depois tentam descrever a realidade que tocaram: cada um deles descreve a realidade de acordo com a parte que tocou, mas nenhum abarca o elefante por inteiro. Sorrio. O importante talvez seja mesmo isso, ver uma parte da realidade, pois seria impossível abarcar o "elefante" todo.

Nem a lembrança do bilhete para entrar na Catedral de Évora no ano passado (Apenas a igreja, não os claustros), nem a auto-estrada cortada pela BT para controlo em Montemor me conseguem fazer zangar com a terra que, mais do que qualquer outra, adoptei como minha.


Regresso tranquilo, tão tranquilo como o Alentejo de minh´Alma, bálsamo para os olhos e para o espírito.

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