sábado, 3 de abril de 2021

Mata-velhos e Pedaços de Telhas

A estória que vos vou contar passou-se há muito, muito tempo, numa galáxia distante. Nessa galáxia havia um planeta, e nesse planeta havia um país chamado Tugalistão. Ora aconteceu que nesse país havia uma fábrica de fósforos, e o governo ditatorial da altura quis proteger a sua fosforeira e ganhar uns trocos em multas. Daí fez uma lei a proibir foguear com isqueiro. Isqueiro só com licença ou, como estava escrito na dita lei, "debaixo de telha". Daí que o comum e ardiloso cidadão da dita república passou a trazer consigo um pedaço de telha, e se quisesse acender o seu cigarro com isqueiro, tratava de fazer isso debaixo da telha, driblando assim os policias! Não faltava expediente, nem ao estado, nem ao desembaraçado cidadão. Acontece que nesse tal Tugalistão houve uma revolução e a ditadura deu lugar à democracia.

Claro, a tal lei ridícula foi abolida. Aconteceu que nesse país, há muito, muito tempo, a democracia descobriu que as crises não conhecem regimes. A penúria voltou a bater à porta, e o tal governo da jovem democracia lá teve que arranjar dinheiro e expedientes para o sacar do bolso do cidadão contribuinte (ou contribuis ou levas no toutiço!). Vai daí uma lei nova: aos 50 anos passas a ser um geronte perigosíssimo e como tal tens que renovar a carta de condução. A coisa funcionava assim, nesse tal planeta numa galáxia distante, há muito, muito tempo: o médico de família não passa o atestado de aptidão médica. Para isso existem escolas, que diabo! Vais à escola (que cobra os seus honorários, que ninguém trabalha de graça). Pagas também ao médico, que nem te põe a vista em cima, mas pagando-lhe os 15 euritos te passa o respectivo atestado. E ganha o estado, que ele também não trabalha de graça. Ou seja, ninguém verificava se estavas apto ou não. Pagavas não bufavas, e pior, já não havia pedaço de telha que te valesse. Os computadores haviam chegado ao Tugalistão, e a democracia, já se sabe, é sempre mais eficiente do que ditaduras catéticas!
Mais curioso ainda, no tal país há muito, muito tempo, numa galáxia distante, o mesmo governo resolveu que os velhotes analfabetos vindos da tal ditadura também mereciam poder conduzir. Vai daí, trataram de parir uma lei que permitia que os tais velhotes comprassem uns carrinhos de baixa cilindrada, e os pudessem conduzir sem qualquer passagem por uma escola ou estudo de regras. Aquilo sempre dava para vender carros mata-velhos a bom preço, e ainda para papar as reformas dos mesmos.
Que o tal Tugalistão se tinha entretanto enchido de auto-estradas perto dos velhos caminhos onde os velhos sempre andaram, a pé, de burro, ou vá lá, de bicicleta, ninguém deu por nada. Agora com auto-estradas junto aos velhos caminhos, era ver os velhos a entrar em contra-mão nas auto-estradas, matando-se e matando os incautos apanhados numa contra-mão. Mas isso são apenas danos colaterais, que raio. Afinal o que importava?! Importava apenas enfiar as mãos nos bolsos de toda a gente e roubar à descarada. Mas atenção, com uma bela capa disfarçada de lei que toda a gente fingia que era muito séria e justificada. Felizmente, volto a frisar, isto foi há muito, muito tempo, e numa galáxia muito, muito distante.

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