quinta-feira, 7 de janeiro de 2021

Luz trémula

 Luz trémula



SÉRGIO CALDEIRA·SEGUNDA-FEIRA, 12 DE AGOSTO DE 2019·1 MINUTE

50 anos. Meio século. Uma eternidade. Um sopro. Havia o cheiro do petróleo, a mecha curta durante toda a noite a queimar o suficiente para haver a ténue luz de presença que espantava o negro da noite. Nesses tempos a electricidade era uma miragem longínqua e a noite era absolutamente negra quando não havia lua. Havia os vidros farruscos para lavar com cuidado no dia seguinte, havia o apito do pitrolim que vinha vender o petróleo, o azeite, fósforos, massas alimentícias e coisas de mercearia. Havia milhares de pirilampos a bruxelear nas noites quentes de Agosto que apanhávamos às centenas, e havia a alegria da infância breve e feliz onde faltava tudo, excepto o importante: colo e comida no prato. Correr descalço sobre o restolho áspero era pura brincadeira, nem cócegas fazia, e curou o pé chato. Meio século: uma eternidade. Um sopro. Um rol de recordações e de saudades que fazem parecer doce o cheiro de petróleo queimado.

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