quinta-feira, 1 de janeiro de 2009

As outras raizes: do lado paterno. Resgaste de uma memória


1996. Mais um dia de trabalho, e mais uma corrida pela cidade. Havia que instalar um novo sistema, desta vez no Barreiro. Lanço o desafio à mana: Maria, vamos até ao Lavradio. Tenho que lá ir a trabalho, e aproveitamos para visitar a nossa tia Cremilde. Aceita o desafio, e meia-hora depois aí vamos nós a correr sobre a 25 de Abril. Trabalho fácil, que se resolve em pouco tempo. Somos recebidos com um afável e surpreso sorriso pela nossa tia por afinidade, esposa de um dos nossos tios paternos. A nossa tia permanece igual: uma senhora magra, de traços finos, educada e tranquila. Grandes amigos dos nossos pais, este ramo da família tinha vindo para o Barreiro, por força da CUF, e por lá cresceu e ficou. A conversa, inevitavelmente tinha que ir parar aos avós, á família, ao Casal. Sabe tia, digo eu, temos tanta pena de não haver retratos dos avós. Há um pequenininho, com o avô, mas é tão pequeno que não se consegue ver a expressão dele. - Mas há sim, sobrinhos. Esperem um pouco.
Olhamo-nos incrédulos, enquanto a nossa tia de dirige ao seu quarto, regressando com uma preciosidade nas mãos: um retrato com o avô António (que apenas a minha irmã Maria conheceu), a avó Amélia, e o tio Zé. Pestanejo, quase não conseguindo acreditar. Aquelas figuras do passado, que para mim e paras as irmãs não passavam de relatos orais, repentinamente tomam forma, rostos!
Esta, diz-nos a tia Cremilde, é a única fotografia que há dos vossos avós paternos. Deu-ma a vossa avó no dia do meu casamento com o vosso tio, quando eu tinha 16 anos. Ela tinha uma grande estima por este retrato, e eu sabia que ela me estava a dar alguma coisa que era muito importante para ela!
Tenho que resgatar isto, pensei. E sei que a Maria também pensou o mesmo.
Sabe, tia, gostávamos tanto de ficar com uma cópia desta foto. Claro, filhos (ela tratava-nos sempre como filhos), levem e copiem. Regressamos felizes a Lisboa, com esta prenda tão inesperada. A tia parecia igualmente feliz por este acontecimento. Menos de um ano passado, e morre, repentinamente. Cremos que ela teve bem presente o que estava a fazer. Era possível que com a sua partida, e mais tarde a do marido, esta fotografia se pudesse ter perdido. Assim, permanece para o futuro. Resgate improvável de um eco do passado. Nas suas poses sérias para o retrato, os avós parecem-me a mim sorrir, lá desse passado longincuo, quando eu e as irmãs ainda não éramos nem sonhados. Justificar completamente

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